1. |
Esse Trem Não Improvisa
03:55
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Os relógios já não marcam nada
E as horas emudecem num vagão
Com gatas loucas e fantasmas
Que derramam toda a gana pelo chão
E mais alguém não secaria tanta confusão
E mais ninguém adiantaria
Porque o trem não improvisa, amor
Um sorriso na estrada
Talvez já trouxesse escrito
Um livro inteiro, mas que nada
Sem as lentes eu não leio lá muito bem
E mais que um beijo não faria um delay bonito
Quiçá um beijo à luz do dia
Mas o trem não improvisa, amor
Um par de pés sempre me levou pr’onde for
Agora bem serviria um artefato voador
Um reumatismo temporal
Que não me deixa mais olhar pra trás
Sem me virar inteiro
Mas nem me oscilam ondas no retrovisor
Por mais um metro nesses trilhos rumo ao impossível
De que adianta a entropia
Se o trem não improvisa, amor?
Esse trem não improvisa.
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2. |
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I
‘Inda brilha a lua que iluminou seu riso
Quando eu lhe falei que não havia ninguém
Como eu, você e eu
No Largo das Neves já é meio-dia
Eu posso saber pela avalanche de luz
Que atravessa você e eu
Eu e eu
E era tão tátil
Você e eu.
Eu e eu
II
Sons, estrondos, válvulas abertas aos borbotões
Que é pra combater a sua poesia na minha surdez
E desenrolar a farsa do Futuro enquanto Agora
Que é a mesma em cada amor
Me cala, amor
Que é a mesma em cada amor
Me cala, amor
Que é a mesma em cada amor
Me calo, amor
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3. |
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Eu me perco pela casa
Mas sempre com a máquina nas mãos
Os dedos quase em brasa
E os olhos comendo o chão
E imaginei por um momento
Tudo isso dentro de um avião
Penso pra que pensar
Se sempre, sempre pensas não
Mas só pensas em um dia
Largar o iê-iê-iê pra trás
E envenenar-te toda
De sedas e cristais
Como a trilha das formigas
Procurando açúcar no quintal
No formicida encontras
Teu fármaco final
(I've got my one baby now
I've got my own baby now
I've got my one baby now
Hurray! for me)
Deslizando tranquilo
Esperando estiar
O céu desabando
E dizendo 'pra que ligar?'
Derretendo contente
Emergindo do caos
Ao cosmos de uma
festa interestelar
E bailando as tuas mornas
Todas se agitam com o ar
Dos rincões de pedra e fogo
E de canções do mar
Mas só chove aqui por dentro
Uma goteira no lugar
Onde a gente imaginava
Um dia se entregar
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4. |
Concórdia
00:52
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Você acredita em Pico della Mirandola
Sabe que não há lugar algum pra nós
Além da estrada, o vento
O movimento
Mas não vá correr sem mim
As livres rotas do arbítrio
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5. |
O vôo de Margarida
04:10
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Eu já no elevador
Num denso adivinhar
Seu úmido espasmo de adeus
Meu brilho seco no olhar
No céu seu plexo de amor
Na Terra a gente a girar
E alternar os papéis
O Mestre e o vôo de Margarida
Mas quando o luar se esconder
E a vassoura aterrisar
Seu Sol sair de Leão
E meu Cronos translacionar
Nalgum sertão diabril
Ou talvez Minas Gerais
Eu sacrifico uns verões
Ao satânico vôo de Margarida
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6. |
Cantiga da fumaça
05:57
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As ruas andam vazias, o bonde sem condutor, e os especialistas todos acreditam que não vingará um novo plano escapista. Parece indigno de ti, mas os planos, as palavras, a cozinha e o chuveiro não querem dizer que o tempo pode parar de se esvaziar. Então leva tudo o que quiser que agarre na memória e empilha nos porões musgosos e mofados que abrigam os amores vãos.
A multidão descabida, sem fundo pra projetar seus maltes, seu silêncio, sua tara, sua prosa mariposa que já vai voar num arremedo de paz que a fumaça traz. Então deixa tudo o que quiser que eu pregue na cortiça que eu acho alguém pra pedalar comigo e toda a minha gangue de almas destemidas, possantes pelas ruas velhas e vazias, em movimento circular como os discos que soam dos porões ruidosos e morgados que abrigam os amores vãos.
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7. |
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É fundamental deixar as outras pessoas arrancarem pedaços meus, enterrarem no fundo dos quintais da mente ou injetarem os olhos neles. Ungirem tudo com manteiga de garrafa, oferecerem ao demônio criador particular que coexiste ali com uma idéia sobre a Revolução de 30, uma dor de dentes ou tudo o mais.
Mais plano.
Mais pleno.
Mais alta a pluviosidade nos artificiosos brejos da alma.
Então arranque pedaços meus. É quase certo que eu não vou morrer de poesia.
Então arranque pedaços meus. E deixe só uma antena a mirar o coração de Júpiter.
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8. |
Cidade nas nuvens
03:52
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Eu vou renascer no ar, numa fazenda de nuvens
E do céu lacrimejar a chuva das minhas lembranças
Na moleira das crianças
E me esquecer que já nadei num mar de esperança
E as pedras que eu um dia atirei no rio que beira a estrada
Ricocheteiam leves antes de afundar como uma pergunta quebrada
Eu vou renascer no ar, minha cidade nas nuvens
E do céu lacrimejar a chuva das minhas lambanças
Na moleira das crianças
E me esquecer que já nadei num mar de esperança
E as pedras que eu um dia atirei no rio que beira a estrada
Ricocheteiam leves antes de afundar como uma pergunta quebrada
Pedras somos nós e pedras não podem com a força do rio a carregar
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9. |
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Na casa de Val, lá na beira do rio, eu ouvi da estrada uma freiada de bicicleta e me lembrei de vocês. Mas não tem nada de nostalgia, não!
Afino e só invento o tempo
Que só eu sei como passa
E anéis de fumaça
Em formação perene
Mas não me encene
Um amor assim sem se acabar
No fundo do mar
Jazem todos os tais naufrágios
Frouxos adágios
Dos corações
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10. |
Nadando
00:59
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11. |
Eugênia
10:31
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Maneiro mesmo é estar
Dentro de uma bolha qualquer
Uma bolsa de mulher
Sempre que carrega
Uma vontade de perder
Um sonho em forma de ser
Vivo em prateado sorrir
Martelo do devir
Sempre que me acerta
Uma urgência de existir
O amor transmuta o real
Revolucionário enquanto
O pulso das canções
Quase inconseqüente e certo
Qual efeito das poções
Eugênia desce o solar
Em esvoaçantes canções
Me esquece até voltar
Quer do mundo a imanência
Que me foge ao despertar
Mas dentro desses olhos teus eu acho que aturo um futuro inteiro.
Maneiro mesmo é ficar
Por um artifício qualquer
Um corpo de mulher
Sempre que carrega uma
Vontade de perder
A cabeça.
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Bonifrate Paraty, Brazil
Bonifrate is a modern bard from Paraty, Brazil, who makes records at home.
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